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05
out
2013

A primeira princesa negra da Disney ou uma marca evidente de preconceito racial?


A primeira princesa negra da Disney ou uma marca
evidente de preconceito racial?
(Por Margareth dos Santos de Jesus[i] 02/08/2013)

“... e foram felizes para sempre.” A história de Tiana tem o final igual ao dos clássicos contos de fada que tanto encantam mulheres, jovens e meninas (e por porque não homens e meninos?) ao longo dos anos. Mas, para que ela chegasse até esse “final feliz” (será mesmo?), ela passou por coisas muito diferentes do que as outras princesas passaram.

Lembro que ao ver na internet a notícia de que a Disney lançaria um filme tendo, pela primeira vez, como protagonista uma princesa negra fiquei “alucinada”. Como grande fã de cinema e de longas animados, procurei saber o dia de estreia, pois tinha que estar lá. 

E fui. E saí da sala com vários questionamentos. Mas, o principal: por que a “saga” de Tiana era tão diferente da das outras princesas? Para início de conversa, ela nem era princesa (recebeu o título após casar-se com um príncipe).

Ariel (A Pequena Sereia), Aurora (A Bela Adormecida), Jasmini Alladin), Cinderela, Branca de Neve e até Bela (A Bela e a Fera) eram princesas ou eram nobres.

Tiana era pobre. Começou a trabalhar cedo para ajudar em casa e, após a morte de seu pai (a quem ela era muito apegada), ela assumiu os negócios da família, lutando para realizar seu sonho (dela e dele) de abrir seu próprio restaurante.

 

Com o título original de The princess and the frog, essa animação foi lançada nos Estados Unidos, pela Walt Disney Animation, em 2009. Sob direção e roteiro de Ron Clemeents e John Musker, tem a duração de 89 minutos e recebeu a classificação de: animação, comédia e fantasia.

O filme começa mostrando a infância de Tiana que acompanhava sua mãe, Eudora, (que era estilista) nas vizitas aos clientes. Sua melhor amiga (Charlotte) era uma menina rica e minada. Ambas gostavam de ouvir histórias sobre príncipes encantados. E o sonho de Charlotte era casar-se com um. 

O tempo passa, Tiana cresce e trabalha (em dois empregos), poupando cada centavo para a compra do seu restaurante. Nessa época, chega à cidade um príncipe (Naveen) bem diferente dos que já conhecemos: com valores, honra, coragem, astúcia... Esse é boêmio, mulherengo, humilha seu empregado, não tem perspectiva de vida e está fálido. Precisa casar urgentemente com alguém que tenha posses. Claro, ele é negro. Se a princesa é negra, o par dela tem que ser negro (perfeito arquétipo da separação das raças: “cada um no seu quadrado”). Seu comportamento descompromissado com a vida e a ânsia para não perder as mordomias a que está acostumado, o acaba levando a fazer um pacto de sangue com bruxo (chamado “homem das sombras”). Coisa que envolve demônio, “magia negra”... Porque, se a princesa é negra, deve que haver “magia negra”, voodoo, sombras, trevas..., pois os negros estão ligados a essas coisas. Será que os negros são negros por pertencerem ao lado negro?

Nesse pacto, o príncipe transforma-se em sapo e o seu empregado (cansado de ser maltratado e humilhado), também faz um pacto e toma o seu lugar. 

Em uma festa na case de Charlotte, Tiana (que está trabalhando como garçonete) sofre “um acidente” (sujando-se toda). Ela, então, se limpa e usa um dos muitos vestidos de princesa da amiga. É quando ela conhece Naveen (já na forma de sapo) que a convence a beijá-lo, acreditando que ela é uma princesa e que, dessa forma, ela voltaria a ser príncipe. Mas, acontece justamente o contrário: Tiana transforma-se em sapa. E a batalha para os dois retornarem à forma normal começa.

É uma verdadeira jornada por pântanos, lugares sombrios e visita a uma feiticeira (Mama Odie). Durante essa viagem, eles se conhecem melhor e, sob a influência positiva de Tiana, Naveen passa a repensar sua vida e mudar alguns comportamentos. Com a feiticeira, eles descobrem que, para quebrar o feitiço, o príncipe tem que beijar Charlotte, que pelo fato de seu pai ser rei momo, só durante o carnaval, ela é princesa (coisa “sem pé nem cabeça”).

Pelo caminho, eles conhecem o jacaré Louis (com um desejo intenso de tocar trompete com humanos) e Raymond (um vaga-lume). Um literal brilho a parte fica por conta de Ray e o seu amor por uma estrela que ele chama de Evangeline (e pensa tratar-se de um vaga-lume fêmea). 



O sangue colhido de Naveen pelo “homem das sombras” acaba e ele começa a procurar o príncipe para colher mais sangue e manter o feitiço. Pois, ele tem um pacto com as trevas de enviar-lhes almas para manter seu poder. Só que, com a ajuda dos amigos de Naveen, ele é derrotado e levado para o lado sombrio.


Já o final é clássico. O verdadeiro arquétipo dos contos de fada: Tiana e Naveen se apaixonam, conseguem reverter o feitiço e o amor vence mais uma vez os tornando “felizes para sempre”. Com o beijo de Charlotte, Naveen vira príncipe e beija Tiana tornando-a princesa. Mas, até chegar nesse final, muito preconceito embutido aparece. Deixando mentes inquietas como a minha a trabalhar bastante.



Ficam, assim, vários questionamentos: por que as outras princesas tiveram fada madrinha, animais mágicos, príncipes guerreiros, até bruxas, madrasta má, vilões diversos, mas apenas Tiana teve sobras demoníacas e pactos sombrios? Será pela sua etnia? Os arquétipos raciais estão muito longe de acabar e nem os desenhos estão livres deles. O preconceito ainda existe e não estão nem se preocupando em camuflá-lo.




[i] Mestre em Linguística Histórica (UFBA), Especialista em Estudos Linguísticos e Literários (UFBA), Bacharel em Língua Inglesa (UFBA), Licenciada em Letras Vernáculas com Inglês (UFBA) e Bacharel Comunicação Social / Habilitação em Relações Públicas (FACS).

3 comentários:

  1. Como os próprios americanos fazem entre si, se separam na cor pela música, (Jazz), por cidades e estados, ( Nova Orleans) por bairros e pontes como no Quinz em nova York, e até msm na Lingua, onde eh a principal identidade de um Estado. e por que seria diferente com Seus filmes, onde o espanto de ser negro em papel de destaque já é o suficiente para apagar qualquer coisa de preconceito que possa estar embutida no contexto. Aqui no brasil não é diferente, pois a grande mídia faz destaque aos primeiros negros de qualquer coisa como se fosse um espanto, ou uma obrigação ser primeiramente destacado pela cor do que pelo trabalho. Joaquim Barbosa! tamo juntos!!!

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  2. Creio que tenha mais preconceito no seu texto do que no próprio filme. Vamos lá , Tiana é negra, não vejo problema nenhum em explorar a cultura negra, religiões negras e músicas negras(assim como fizeram com a Mulan que é chinesa, Pocahontas que é índia e Jasmine que é uma princesa árabe), em relação ao príncipe é balela dizer que ele é preguiçoso, interesseiro só porque é negro, Aladdin também é assim e não é necessariamente negro. Sobre a Tiana, ela não era princesa(Bela também não era, nem Mulan), mas era uma garota inteligente, linda, honesta, persistente... Enfim , são vários os adjetivos. Eu acho que as pessoas enxergam preconceito onde não tem , concordo que nem todo negro ouve música negra, ou frequenta religiões ''negras'', mas esconder ou negar que essa culta não seja negra é no mínimo falta de noção. Já sobre o enredo, vamos trocar pelo da Cinderela, que é branca e tem cabelos e olhos claros, passa metade do filme sendo humilhada,escravizada e de joelhos esfregando o chão e ninguém fala absolutamente N-A-D-A, por que ? aaaaah , porque ela é branca.Eu vejo o filme como uma homenagem a cultura afro-norte americana, a princesa mostra a luta do povo, além de mostrar valores essenciais. A historia dela não é muito diferente das outras princesas, é só você assistir novamente todos os outros clássicos e comparar ;)

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  3. Tenho certeza de que ou eu não me expressei de maneira correta ou você não entendeu meu ponto de vista. Mas, respeito sua opinião e agradeço seu comentário.

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